Olá,
variáveis!!! Neste dia das mães venho lhes contar um pouco da história do
Oliveira junto a sua mãe, Cecília. Espero que gostem e que entendam a mensagem.
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Desenho produzido por Gabriel Pêra
Ausência Profunda
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Estive
na estação shopping esses dias, lá observo tudo nos mínimos detalhes, até mesmo
coisas bobas como sacolas, a novidade da vez são as com a temática dia das
mães, os slogans são de todos os tipos, dos mais clichês, aos que exigiram
certo trabalho da equipe de marketing.
Foram
vários presentes que vi passar, o que me fez refletir sobre o dia das mães e
sobre as próprias. O tal dia surgiu nesse mundo quando eu ainda era vivo, mas
já bem longe da mocidade. Foi mais ou menos em 1920 que a data começou a ser
comemorada no Brasil. Bom... O fato é que eu não cheguei a presentear minha mãe
nessa comemoração, ela sumiu no mundo antes.
Lembro-me
disso como se não houvesse sido a mais de cem anos. Era 1883, eu tinha bem meus
22 anos, meu pai, Antônio Ferro Quente, tinha viajado para comprar mais um
escravo, pesquisar sobre o mercado, ou qualquer outra coisa que um cafeicultor
fizesse naquela época. Eu e minha mãe viajamos também, não que o velho
soubesse disso, fomos ao Rio de Janeiro e a viagem foi maravilhosa, visitamos o
centro, vimos o mar em seu azul profundo e depois seguimos para Petrópolis,
pela nova porção da estrada de ferro Mauá, minha mãe era fascinada por trens e
por arquitetura, logo, aquele passeio era ideal. Conhecemos a cidade imperial e
nunca vi Dona Cecília tão feliz, eu também estava demasiado contente, mais
próximo de minha matriz.
Tamanha
magia se desfez na volta para o Rio, quando estávamos pegando o trem de volta
para a estação central minha mãe fez uma revelação, daquelas que mudam a vida
de qualquer um. Estávamos aguardando o novíssimo trem sob a luz da tarde quando
Dona Cecília levantou de supetão, pegou minhas mãos e disparou a falar:
-
Meu filho... Olhe bem, eu não voltarei contigo, eu fico por aqui. - Ela
esperava alguma reação minha, mas no momento estava paralisado, do que ela
estava falando? – Você sabe o quanto o seu pai pode ser difícil, ele é um homem
duro e frio, tão frio que minha sensibilidade já não aguentava, sabe, eu quero
viver, quero sentir o mundo e não ficar presa naquela casa, vendo o sofrer
daquele povo e a pilha de dinheiro sangrento dele crescer. Mas quero que saiba
que te amo, onde quer que eu esteja estarei pensando em ti.
Pela
primeira vez naquele curto espaço de tempo, consegui abrir a boca:
-
Mas como você vai ficar? Com que dinheiro? Onde? Ficará Sozinha? – Não
aguentava imaginá-la desamparada.
-
Eu ficarei bem, tinha minhas economias, afinal, minha família não é nada pobre.
Tenho a casa de amigos para ficar, longe de São Paulo. Mas o que quero mesmo é
fazer uma casa minha em algum lugar nesse mundo.
Nesse
momento o aviso de que o trem estava para chegar soou e minha mãe foi
agilizando o que tinha a fazer. Pegou uma carta e me entregou explicando:
-
Olhe, diga ao seu pai que quando você acordou em Petrópolis eu tinha sumido,
que me procurou por toda a cidade e não me encontrou nem rastro.
Olhei
para ela, bem no fundo de seus meigos olhos e a abracei. Soube que era a coisa
certa a fazer, que ela precisava ir. Senti novamente as vezes em que cuidou de
mim, as milhares de vezes. Percebi também que aquilo era o que queria fazer a
muito tempo, mas se privou por conta de mim. Naquele momento era eu que tinha
que cuidar dela, fazê-la feliz, e deixá-la partir era o único modo.
O
trem estava lá, deu um último beijo em sua bochecha e pedi a ela para que se
cuidasse e que se pudesse mandasse notícias, mesmo sabendo que seria difícil.
Então entrei no vagão e fui, deixando o meu maior amor para trás, o amor de
mãe. Nunca havia sido tão homem em toda a minha vida.
Meu
pai pareceu ter mudado após meses mandando patrulhas para procurá-la, todas
elas falhas. Não sei bem o porquê, mas também alforriou todos os escravos que
mantinha na fazenda. Volta e meia o pegava no ateliê da mamãe, chorando sobre
os quadros. Parecia que todo o seu lado bom percebia que as coisas poderiam ter
sido diferentes.
Eu
mesmo tinha saudade, mas nenhuma tristeza em meu coração, tinha plena certeza
de que ela estava bem, onde quer que seja. A imaginava pegando um navio e indo
parar na Europa, vivendo os seus dia de glória na tal Belle Époque. Anos depois
visitei o Rio, uma confeitaria gigantesca tinha aberto no centro, comendo mil
folhas e tomando um bom café eu me lembrava dela.
É,
eu queria ter podido comemorar com ela um dia assim, um dia dela. Mãe é algo
raro, é um estado de espírito além da compreensão geral. Mãe não pensa como os
outros, vai além de tudo, imaginando consequências e prevenções. Mãe e coração
têm uma ligação forte, o delas bate eternamente, mesmo que dentro dos
filhos.
Ali
na estação eu fiquei, me lembrando de tudo o que acabo de dizer, sentindo o
coração dela bater em sua ausência profunda no meu próprio.
Feliz dia das mães a todos vocês! Até a próxima.
Beijão!!! 😉💖